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domingo, 15 de agosto de 2010

Até tu?

Colo aqui uma entrevista retirada do jornal da Consulta Popular, também conhecido como jornal do MST. O entrevistado foi João Pedro Stedile, um dos nomes mais influences dentro do movimento sem terra.

Antes da cola, comento.

As análises do capitalismo são lugar-comum dentro do campo da esquerda. Claras, sim, mas nada muito diferente do que quarquer militante de esquerda minimamente bem informado não saiba.

O problema está em mais uma tentativa da Consulta Popular, agora na figura de Stédile, nos levar a entender que ou votamos em Dilma ou o mundo acabará. Joga mais uma vez um peso na luta eleitoral qeu deveria ser condensada para a luta programática e não pela disputa do poder.

Usa o nome de Gramsci em vão, em uma leitura, no mínimo, equivocada de disputa hegeônica. Não tem nada de Gramsci em Dilma e Stédile sabe.

A substituição de disputa de hegemonia, no sentido gramsciniano, por um terrorismo apocalíptico, como fez Stédile, faz mal a esquerda. Se disputar a hegemônia significa abrir mão do programa revolucionário e de pautas mínimas, como a própria reforma agrária, então provavelmente o Gramsci de Stédile é bem diferente do meu. Talvez Carlos Nelson Coutinho, talvez o maior especialista no escritos italiano, possa desempatar essa.

Os movimentos sociais urbanos, asssim como diversas organizações das cidades, podem se dividir e discordar em relação ao programa que a esquerda deveria adotar no precesso eleitoral em curso.

Bem ou mal, os três candidatos da esquerda possuem algumas divergências que são caras a esquerda e que não devem ser esquecidas ou diminuidas. A mais importante talvez seja a compreensão do potencial revolucionário do proletariado, ou até que é mesmo esse proletariado.

Pelo o que tenho lido, o PCB parece se aproximar mais de uma compreensão "ortodoxa", como diria Sérgio Lessa, do protagonismo do proletariado. O PSTU demonstra cada dia mais uma aproximação a uma certa centralidade da classe trabalhadora, dos excluídos. Já o Psol já defende claramente essa posição, isso quando não aponta para um caminho de disputa eleitoral, no sentido "gramsciniano de Stédile".

Bem, a entrevista segue. Veremos por onde a esquerda caminhará neste processo.


Serra representa a burguesia e a volta do neoliberalismo

Nilton Viana

da Redação

A candidatura de José Serra (PSDB) representa o núcleo central dos interesses da burguesia e a volta do neoliberalismo. Esta é a avaliação João Pedro Stedile. Em sua primeira entrevista ao Brasil de Fato, o dirigente nacional do MST e da Via Campesina constata que, no atual cenário eleitoral, as candidaturas não estão debatendo programas, projetos para a sociedade. Mas, segundo ele, elas representam claramente interesses diversos de forças sociais organizadas. Nesse sentido, Stedile afirma que Serra representa os interesses da burguesia internacional, da burguesia financeira, dos industriais de São Paulo, do latifúndio atrasado, com Katia Abreu de coordenadora de finanças e setores do agronegócio do etanol. E, frente a esse cenário, defende que, “como militantes sociais, e como movimentos sociais, temos a obrigação política de derrotar a candidatura Serra”.

Brasil de Fato – Com a implementação do modelo neoliberal, os bancos e o capital financeiro aumentaram seus lucros e passaram a dirigir a economia do Brasil, que se sustenta na política de juros altos, meta de inflação, arrocho fiscal e política de exportações. Quais as consequências desse modelo?

João Pedro Stedile – Estamos vivendo a etapa do capitalismo que se internacionalizou, dominou toda a economia mundial sob a hegemonia do capital financeiro e das grandes corporações que atuam em nível internacional. O mundo é dominado por 500 grandes empresas internacionalizadas, que controlam 52% do PIB mundial e dão emprego para apenas 8% da classe trabalhadora. As consequências em nível mundial são um desastre, pois toda população e os governos nacionais precisam estar subordinados a esses interesses. E eles não respeitam mais nada, para poder aumentar e manter suas taxas de lucro. Seus métodos vão desde a apropriação das riquezas naturais, deflagração de conflitos bélicos para manter as fontes de energias e controle do Estado, para se apropriarem da mais-valia social ou poupança coletiva através dos juros que os estados pagam aos bancos. No Brasil, a lógica é a mesma. Com um agravante, sendo uma economia muito grande e dependente do capital estrangeiro, aqui o processo de concentração de capital e de riqueza é ainda maior. Esta é a razão estrutural do porquê – apesar de sermos a oitava economia mundial em volume de riquezas – estamos em 72º lugar nas condições médias de vida da população e somos a quarta pior sociedade do mundo em desigualdade social. Portanto, essa fase do capitalismo, em vez de desempenhar um papel progressista no desenvolvimento das forças produtivas e sociais, como foi a etapa do capitalismo industrial; agora, os níveis de concentração e desigualdade só agravam os problemas sociais.

Mesmo com a eleição de governos mais progressistas, o Estado brasileiro mantém seu caráter antipopular, sem a realização de mudanças mais profundas que resolvam os problemas estruturais do país. Como você avalia a democracia e o Estado no Brasil?

Primeiro, há uma lógica natural do funcionamento da acumulação e da exploração do capital que sobrepõe os governos e as leis. Segundo, no período neoliberal, o que o capital fez foi justamente isso, privatizar o Estado. Ou seja, a burguesia transformou o Estado em seu refém, para que ele funcione apenas em função dos interesses econômicos. E sucateou o Estado nas áreas de políticas públicas de serviços que servem a toda população, como educação, saúde, transporte público, moradia etc. Por exemplo, temos 16 milhões de analfabetos. Para alfabetizá-los, custaria, no máximo, uns R$ 10 bilhões. Parece muito – o Estado, com todo seu aparato jurídico impede de aplicar esse dinheiro –, mas isso representa duas semanas do pagamento de juros que o Estado faz aos bancos. Construímos viadutos e estradas em semanas, mas para resolver o deficit de moradias populares é impossível? Temos ainda 10 milhões de moradias faltando para o povo.

Por último, a sociedade brasileira não é democrática. Nós nos iludimos com as liberdades democráticas de manifestação, que conquistamos contra a ditadura, que foram importantes. Mas a verdadeira democracia é garantir a cada e a todos cidadãos direitos e oportunidades iguais, de trabalho, renda, terra, educação, moradia e cultura. Por isso, mesmo quando elegemos governos com propostas progressistas, eles não têm força sufi ciente para alterar as leis do mercado e a natureza do Estado burguês.

Na política internacional, o governo Lula investiu na relação com países do hemisfério Sul, com o fortalecimento do Mercosul e da Unasul, por exemplo. Qual a sua avaliação dessa política e quais os seus limites?

O governo Lula fez uma política externa progressista no âmbito das relações políticas de Estado. E uma política dos interesses das empresas brasileiras, nos seus aspectos econômicos. Comparado às políticas neoliberais de FHC, que eram totalmente subservientes aos interesses do imperialismo, isso é um avanço enorme, pois tivemos uma política soberana, decidida por nós. Na política, se fortaleceram os laços com governos latinos e daí nasceu a Unasul para a América do Sul, e a Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac) para todo o continente, excluindo-se os Estados Unidos e o Canadá. Esses dois organismo representam o fim da OEA. Aliás, já tarde. Na economia se fortaleceram laços econômicos com países do Sul. Mas ainda precisamos avançar mais na construção de uma integração continental que seja de interesse dos povos, e não apenas das empresas brasileiras, ou mexicanas e argentinas. Uma integração popular latino-americana no âmbito da economia será o fortalecimento do Banco do Sul, para substituir o FMI. O banco da Alba, para substituir o Banco Mundial. E a construção de uma moeda única latino-americana, como é proposto pela Alba, através do sucre, para sair da dependência do dólar. Se queremos independência e soberania econômica nas relações internacionais e latino-americanas, é fundamental colocarmos energias para derrotar o dólar. O dólar foi fruto da vitória estadunidense na segunda guerra mundial e tem sido, nessas décadas todas, o principal mecanismo de espoliação de todos os povos do mundo. Num aspecto mais amplo, o presidente Lula tem razão: as Nações Unidas não representam os interesses dos povos, e por isso é besteira o Brasil sonhar em ter a presidência. Precisamos é construir novos e mais representativos organismos internacionais. Mas isso não depende de propostas ou vontade política. Depende de uma nova correlação de forças mundial, em que governos progressistas sejam maioria. E hoje não são.

O sistema de televisão e rádio é extremamente concentrado no Brasil, em comparação até com os outros países da América Latina. Quais as consequências disso para a luta política?

Durante o século 20, hegemonizado pela democracia republicana e pelo capitalismo industrial que produziu uma sociedade de classes bem definida, a reprodução ideológica da burguesia se dava pelos partidos políticos, pelas igrejas e pelos sindicatos e associações de classe. Agora, na fase do capitalismo internacionalizado e financeiro, a reprodução da ideologia dominante se dá pelos meios de comunicação, em especial redes de televisão e as agências internacionais de noticias. A burguesia descartou os outros instrumentos e prioriza estes, os quais tem controle total. Por isso, no Brasil, na América Latina e em todo o mundo, os meios de comunicação estão sob controle absoluto das burguesias. E eles usam como reprodução ideológica, como fonte de ganhar dinheiro e como manipulação política. E como seus patrões estão internacionalizados, suas pautas e agendas estão também centralizadas. Por isso, a construção de um regime político mais democrático, mesmo nos marcos do capitalismo, depende fundamentalmente da democratização dos meios de comunicação. Isso é fundamental para garantir o direito ao acesso à informação honesta e impedir a manipulação das massas. E os governos deveriam começar eliminando a publicidade estatal, em qualquer nível, em qualquer meio de comunicação. É uma vergonha o que se gasta em publicidade oficial. No Paraná, para se ter uma ideia, em oito anos de governo Lerner [1995-2002], o Estado pagou mais de R$ 1 bilhão em publicidade para dois ou três grupos de comunicação.

As grandes cidades brasileiras enfrentam problemas como falta de habitação, saneamento básico, escolas, hospitais, além de trânsito e violência. Como você analisa a questão urbana?

A maior parte da população se concentra nas grandes cidades, e aí estão concentrados também os pobres e os maiores problemas resultantes desse modelo capitalista, e de um Estado que atua somente em favor dos ricos. Os pobres das grandes cidades se amontoam nas periferias, não têm direito a moradia, escola, transporte público decente, trabalho, renda. Nem a lazer. Sobram os programas de baixaria da televisão como lazer. Nesse contexto é evidente que o sistema gera um ambiente propício para o narcotráfico, para a violência social.

E o Estado, o que tem feito através dos mais diferentes governos?

A única resposta tem sido a repressão. Mais polícia, mais violência oficial, mas cadeia. As cadeias estão cheias de pobres, jovens, mulatos ou negros. Há uma situação insustentável de tragédia social. Todos os dias assistimos os absurdos da desigualdade social, do descaso do Estado e da truculência do capital. As estatísticas são aterrorizantes: 40 mil assassinatos por ano nas grandes cidades, a maioria pela polícia. Por isso os movimentos sociais apoiaram a campanha pelo desarmamento. Mas a força das empresas bélicas financiou deputados, campanhas etc., e o povo caiu na ilusão de que o problema da violência urbana se resolveria tendo o direito de ter arma. Acredito que a pobreza e a desigualdade nas grandes cidades brasileiras é o problema social mais grave que temos. Infelizmente nenhum candidato está debatendo o tema, nem quando o debate é para prometer segurança! Segurança para quem? As famílias precisam de segurança de trabalho, renda, escola para os filhos.

Nas eleições presidenciais, o quadro apresenta duas candidaturas que polarizam a disputa, enquanto as outras não demonstram força para mudar essa situação. Nessa conjuntura, quem abre melhores perspetivas para a classe trabalhadora e para a reforma agrária?

As candidaturas não estão debatendo programas, projetos para a sociedade. Mas as candidaturas representam claramente interesses diversos de forças sociais organizadas. Serra representa os interesses da burguesia internacional, da burguesia financeira, dos industriais de São Paulo, do latifúndio atrasado, com sua Katia Abreu de coordenadora de finanças, e setores do agronegócio do etanol. Dilma representa setores da burguesia brasileira que resolveram se aliar com Lula, setores mais arejados do agronegócio, a classe média mais consciente, e praticamente todas as forças da classe trabalhadora organizada. Vejam, apesar de toda popularidade do Lula, nessa campanha, a Dilma reuniu mais forças da classe trabalhadora do que na eleição de 2006. A candidatura da Marina representa apenas setores ambientalistas e da classe média dos grandes centros, e por isso seu potencial eleitoral não decola. E temos três candidaturas de partidos de esquerda, com companheiros de biografia respeitada de compromisso com o povo, mas que não conseguiram aglutinar forças sociais ao seu redor, e por isso, o peso eleitoral será pequeno. Nesse cenário, nós achamos que a vitória da Dilma permitirá um cenário e correlação de forças mais favoráveis a avançarmos em conquistas sociais, inclusive em mudanças na política agrícola e agrária. E evidentemente que nesse cenário incluímos a possibilidade de um ambiente propício para maior mobilização social da classe trabalhadora como um todo, para a obtenção de conquistas. Como militantes sociais, e como movimentos sociais, temos a obrigação política de derrotar a candidatura Serra, que representa o núcleo central dos interesses da burguesia e a volta do neoliberalismo.

O MST apresentou uma avaliação de que a luta eleitoral não é sufi ciente para a realização das mudanças sociais. Por outro lado, analisa que é um momento importante no debate político. Como o MST vai se envolver nessas eleições?

A esquerda brasileira, os movimentos sociais e políticos ainda estão aturdidos com a derrota político-ideológica-eleitoral que sofremos em 1989. Isso levou a muitas confusões, e também a alguns desvios de setores da classe. Vivemos um período da história da luta de classes de nosso país – e poderíamos dizer em nível internacional, na maioria dos países – em que a estratégia para conseguir acumular forças para mudanças sociais é a combinação da luta institucional com a luta social. Na luta institucional, compreendemos a visão gramsciana na qual os interesses da classe trabalhadora precisam disputar e ter hegemonia na disputa de governos nos três níveis: municipal, estadual e federal. Nos espaços do conhecimento, universidade, meios de comunicação. Nos sindicatos, igrejas e outras instituições da sociedade de classes. E a luta social são todas as formas de mobilização de massa, que possibilitam o desenvolvimento da consciência de classe e a conquista de melhores condições de vida – sabendo que elas dependem de derrotar os interesses do capital. Pois bem, o que aconteceu no último período? Parte da esquerda e da classe trabalhadora priorizou a luta institucional da disputa apenas de governos e menosprezou, desdenhou a luta social. E parte dos movimentos sociais, desencantado com a crise ideológica, desdenhou a luta institucional, como se a luta direta, de massas, fosse sufi ciente. Luta social apenas, sem disputar projeto político na sociedade e sem disputar os rumos institucionais do Estado, não consegue acumular para a classe. Podem até eventualmente resolver problemas pontuais da classe, mas não mudam a natureza estrutural da sociedade. O MST compreende que devemos aglutinar, combinar, estimular as duas formas de luta, de forma permanente. Para que com isso possamos acumular forças, organizadas, de massa, de forma orgânica, que construa um projeto político da classe e ao mesmo tempo crie condições para o reascenso do movimento de massas, pois este é o período histórico em que a classe tem condições de ir para a ofensiva, de tomar inciativa política, de pautar seus temas para todo o povo. Por isso, claro que todo militante do MST, como cidadão consciente, deve arregaçar as mangas e ajudar a eleger os candidatos mais progressistas em todos os níveis. Isso é uma obrigação de nosso compromisso com a classe.

Desde os tempos do governo FHC, José Serra fez declarações contra a reforma agrária e o MST. No entanto, nas últimas semanas, vem intensificando os ataques. Na sua visão, por que ele vem agindo dessa forma?

Por dois motivos. Primeiro, porque as forças sociais que ele representa agora, como porta-voz maior, são as forças da classe dominante do campo e da cidade, que são contra os interesses dos camponeses, da classe trabalhadora em geral e do povo brasileiro. Portanto, ele é contra a reforma agrária não porque não goste do MST, mas por uma questão de interesse de classe. Segundo, na minha avaliação, é que a coordenação tucana acha que a única chance do Serra crescer eleitoralmente é adotar um discurso de direita, para polarizar e, então, se mostrar mais de confiança do que a Dilma. Por isso adotou todos os ícones da esquerda para bater. Bate em nós, em Fidel, em Cuba, Chávez, Evo Morales, até no bispo Lugo ele bateu. Achou uma conexão das Farc com o PT absurda. Ele sabe que o partido está mais próximo da social-democracia. Não é por ignorância, é por tática eleitoral. Acho que ele errou também na tática. E vai ficar refém de seu discurso de direita sem ampliar os votos. Eu acho ótimo que ele se revele como direitista mesmo. Ajuda a clarear os interesses de classe das candidaturas. E por isso mesmo vai perder de maior diferença do que o Alckmin perdeu do Lula em 2006.

Atualmente, o movimento sindical vem fazendo a luta pela redução da jornada, mas está fragmentado em uma série de centrais sindicais. Quais os problemas e desafios da luta sindical atualmente?

Não tenho a pretensão de dar lições a ninguém. Há valorosos companheiros que atuam na luta sindical que têm muitos elementos para analisar a situação da organização de classe. Os problemas e desafios da organização sindical são evidentes. Mas não estão no número de sindicatos ou de centrais. Isto, ao contrário, até poderia ser visto como vitalidade, já que as correntes sindicais sempre existiram, são importantes e aglutinam por vertentes ideológicas. Os desafios da unidade da classe nos sindicatos passam pela necessidade de recuperarmos o trabalho de base, a organização, de toda a classe, lá no local de trabalho e no de moradia. Ninguém mais quer fazer reunião na porta de fábrica, na fábrica (mesmo que de forma clandestina, como era nos tempos do Lula). Precisamos recuperar o sentido da luta de massas como a única expressão da força da classe. Precisamos recuperar o debate de temas políticos, relacionados com um programa para a sociedade que extrapole as demandas salariais e corporativas. Precisamos recuperar a importância de o movimento sindical ter seus próprios meios de comunicação de massa. Saúdo a chegada da televisão dos trabalhadores no ABC. Mas precisaríamos ter antes, e em todas regiões metropolitanas. Precisamos recuperar a formação de militantes da classe trabalhadora, em todos os níveis. Sem conhecimento, sem teoria, não haverá mudanças. E, com essas iniciativas, certamente poderemos construir um processo de maior unidade, já que os interesses da classe como um todo serão o denominador comum, e de construção do reascenso do movimento de massas.

Um grupo de dirigentes e estudiosos avalia que a sociedade brasileira passou por uma transformação, e sindicatos e partidos políticos não são suficientes para organizar o povo brasileiro, especialmente com o aumento da informalidade. Com isso, seria necessário construir novos instrumentos para a luta política. Como você avalia os desafios organizativos da classe trabalhadora?

As formas de organização da classe em partidos, sindicatos e associações de bairro foram desenvolvidas pela classe, como respostas ao desenvolvimento da exploração pelo capitalismo industrial, desde os tempos de Marx até os dias atuais. Acho que o problema não é ficar analisando se serve ou não, jogar tudo fora e pensar novos instrumentos. Cada tempo histórico tem suas formas de organização, suas formas de luta de massa e produz suas próprias lideranças. Estamos vivendo um período de derrota político-ideológica que gerou crise ideológica e organizativa na classe. Um período de refluxo do movimento de massas. Mas isso faz parte de um período, de uma onda. Logo ingressaremos em novos períodos. Acho que o principal não é discutir a forma, mas tratar de organizar de todas as maneiras possíveis todos os setores da classe trabalhadora. E evidentemente que a forma sindical ou partidária não está conseguindo chegar na juventude pobre, da classe trabalhadora das periferias. E precisamos descobrir novos métodos e novas formas. As formas podem ter outros rótulos, outros apelidos, mas o principal é que a classe precisa se organizar do ponto de vista econômico, corporativo, para resolver suas necessidades e problemas imediatos; e precisa ter organização política, para disputar projetos para a sociedade. E só vamos resolver os problemas de organização organizando. A prática é a melhor conselheira, do que grandes teses, nesse caso.

Dentro de um modelo que tem hegemonia de bancos e do capital financeiro, com o enfraquecimento da indústria, baseado no consumo de massa, quais as perspectivas de futuro para a juventude?

A juventude pobre, da classe trabalhadora urbana, não tem espaço nesse modelo de dominação do capital financeiro e internacionalizado. Nem nos países chamados ricos, como na Europa, onde o desemprego atinge até 40% da juventude. O futuro da juventude está justamente em desenvolver uma consciência como classe trabalhadora. Se apenas ficar se olhando como jovem e sem oportunidades, não vai encontrar as respostas, vai ficar velho sem as respostas. Precisamos desenvolver consciência de classe, e motivá-los para que se mobilizem, lutem. E como estão fora das fábricas, da escola, temos que desenvolver novas formas de trabalho político com a juventude, que a ajude a debater, a se aglutinar, para que descubra que o futuro é agora. Tenho esperanças, há uma massa enorme da juventude trabalhadora urbana que está em silêncio. Ou ainda alienada, iludida. Alguns tentando entrar no mercado consumidor, como se fosse a felicidade geral. Logo perceberão que precisam ter uma atitude, uma participação ativa na sociedade.

O MST vem fazendo a avaliação de que a reforma agrária não avançou durante o governo Lula. Por quê?

É preciso ter claro os conceitos e o significado da reforma agrária. Reforma agrária é uma política pública, desenvolvida pelo Estado, para democratizar a propriedade da terra e garantir o acesso a todos os camponeses que queiram trabalhar na terra. Do ponto de vista histórico, ela surgiu numa aliança da burguesia industrial no poder com os camponeses que precisavam terra, para sair da exploração dos latifundiários. E, assim, a maioria das sociedades modernas fez reforma agrária a partir do século 19 e ao longo do século 20. Depois tivemos as reformas agrárias populares e socialistas, que foram feitas por governos populares ou revolucionários, no bojo de outras mudanças sociais. Aqui no Brasil nunca tivemos reforma agrária. A burguesia brasileira nunca quis democratizar a propriedade da terra. Ela preferiu manter aliança com os latifundiários para que continuassem exportando matérias-primas (e aí ela usaria os dólares da exportação para bancar a importação de máquinas) e sobretudo preferiu expulsar os camponeses para a cidade, para criar um amplo exército industrial de reserva, que manteve ao longo do século 20 os salários industriais mais baixos de todas as economias industriais do mundo. E os camponeses brasileiros nunca tiveram forças, sozinhos nem em aliança com os trabalhadores da cidade, para impor uma reforma agrária aos latifundiários. Chegamos mais perto disso em 1964. E tivemos um baita programa de reforma agrária, em aliança com o governo Goulart. A resposta da burguesia foi se aliar com Império e impor a ditadura militar de classe. As políticas dos governos no Brasil e do governo Lula são de assentamentos rurais. Ou seja, aqui e acolá, pela força da pressão camponesa, desapropria algumas fazendas para aliviar os problemas sociais. Mas isso não é reforma agrária. Tanto que o censo do IBGE de 2006 revelou que agora a concentração da propriedade da terra é maior do que no censo de 1920, quando recém saímos da escravidão. E no governo Lula não tivemos espaço para debater um processo de reforma agrária verdadeiro, e nem tivemos força de massas para pressionar o governo e a sociedade. Por isso, a atual política de assentamentos é insuficiente por um lado, mas reflete a correlação de forças políticas que há na sociedade. Lamentamos apenas que algumas forças dentro do governo se iludam a si mesmas, fazendo propaganda ou achando que essa política de assentamentos – insuficiente – fosse reforma agrária.

Alguns estudiosos e setores sociais, até mesmo na esquerda, avaliam que passou o tempo da reforma agrária no Brasil. Qual o papel da reforma agrária dentro do atual estágio de desenvolvimento?

É verdade, nós também dizemos isso. Não há mais espaço para uma reforma agrária clássica, que visava apenas distribuir terra aos camponeses e eles produziriam com suas próprias forças e família para o mercado interno. Esse modelo era viável no auge e para o desenvolvimento nacional e do capitalismo industrial. Mas ele é inviável não porque o MST desdenha, e sim porque as forças políticas e sociais que poderiam ter interesse não têm mais. Se houvesse uma reviravolta nas classes que dominam o Brasil, e um novo projeto de desenvolvimento nacional e industrial entrasse na pauta política, aí a reforma agrária clássica teria lugar. Mas não é isso que se desenha. Então, qual a alternativa agora? É lutar por um novo tipo de reforma agrária. Uma reforma agrária que nós chamamos de popular. Que o movimento de pequenos agricultores chama de Plano Camponês, que a própria Contag e Fetraf chamam de agricultura familiar. São rótulos diferentes para um conteúdo semelhante. Ou seja, nós precisamos reorganizar o modelo de produção agrícola do país. Nós queremos usar nossa natureza para uma agricultura diversificada, fixando as pessoas no meio rural com melhoria das condições de vida, eliminando o latifúndio (não precisa ser muitos, apenas os acima de 1.500 hectares), adotando técnicas de produção de agroecologia, respeitosas ao meio ambiente e, sobretudo, produzindo alimentos sadios para o mercado interno. Nossa proposta de reforma agrária popular, no entanto, depende de um novo modelo de desenvolvimento, que tenha distribuição de renda, soberania nacional, rompimento com o domínio do capital estrangeiro sobre a agricultura e a natureza.

Como a reforma agrária pode beneficiar o conjunto da sociedade, especialmente a população das cidades?

A reforma agrária e a fixação do homem no campo são fundamentais para reduzir o desemprego na cidade e elevar os patamares do salário mínimo e a média salarial. A burguesia só paga baixos salários e aumenta o número de empregados domésticos porque todos os dias chegam milhares de novos trabalhadores se oferecendo para serem explorados. A reforma agrária é a única que pode produzir sem venenos. A grande propriedade do agronegócio só consegue produzir com veneno, porque não quer mão de obra, e esse veneno vai para o estômago de todos nós. Na última safra foram um bilhão de litros de venenos, 6 litros por pessoa, 150 litros por hectares. Uma vergonha. Um atentado. A reforma agrária ajuda a resolver o problema de moradia e do inchaço das cidades. Também vai reequilibrar o meio ambiente e com isso teremos menos mudanças climáticas que estão afetando agora, com mais força, as cidades. Vejam o que aconteceu no Nordeste. Num dia, 13 cidades foram varridas do mapa pelas chuvas torrenciais. Não foi a chuva a culpada, e sim o monocultivo da cana que alterou o equilíbrio e empurrou o povo para a beira do rio. Mas isso só o general Nelson Jobim viu e teve coragem de dizer. A Globo ficou quietinha procurando acobertar. Nenhuma área de reforma agrária de Pernambuco e Alagoas foi atingida, por que será? E nossos assentamentos foram os primeiros, antes do governo, a dar guarida aos desabrigados.

Por que a Via Campesina e o MST vêm realizando protestos contra as grandes empresas do agronegócio? As ocupações de terras não são sufi cientes ou não servem mais para a luta pela reforma agrária?

Como disse antes, agora a disputa não é mais apenas entre os pobres sem-terra e os latifundiários. Agora é uma disputa de modelo para produção e uso dos bens da natureza. De um lado temos o agronegócio, que é a aliança entre os grandes proprietários, o capital financeiro, que os financia – veja que, de uma produção de R$ 112 bilhões, os bancos adiantam R$ 100 bi para eles poderem produzir –, as empresas transnacionais que controlam a produção de insumos, sementes, o mercado nacional e internacional e as empresas de mídia. E, de outro lado, os sem-terra, os camponeses com pouca terra e a agricultura familiar em geral. E nesse marco de disputa, nosso inimigo principal são os bancos e as empresas transnacionais. Então, fazemos a luta de classes contra nossos inimigos principais e ao mesmo tempo devemos seguir lutando para melhorar as condições de vida, com novos assentamentos, moradia rural, luz para todos, programa de compra de alimentos pela Conab, um novo crédito rural etc. Essas medidas, embora setoriais, também ajudam a acumular força como classe.

Nos próximos dias, o MST vai realizar atividades pela reforma agrária. Como serão essas mobilizações e quais seus objetivos? Elas têm alguma relação com o período eleitoral?

A coordenação nacional do MST escolheu há tempos essa semana de meados de agosto para realizar uma campanha nacional de debates em torno da reforma agrária. É uma forma concentrada de esforços para desenvolver diferentes maneiras de agitação e propaganda; para levar nossas ideias à classe trabalhadora urbana; para denunciar os problemas e malefícios que o agronegócio, com seus venenos e sua sanha concentradora, causa para toda a sociedade; e, ao mesmo tempo, mostrar justamente os benefícios de uma reforma agrária popular. Esperamos que nossa militância se engaje em todo país, para essa jornada de conscientização de massas.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Começou o Fórum Social Américas

O IV Fórum Social Américas (FSA), instalado no coração do continente, teve início com uma marcha pelas principais ruas de Assunção, milhares de pessoas marcharam do Conselho Nacional de Esportes para o edifício do Cabido, situado no centro da cidade. Por 10 quilômetros delegações de mais de 600 organizações sociais vindas de diversos países da América Latina, transformaram as ruas da capital com suas bandeiras coloridas.

A frente da marcha estavam camponesas e indígenas da Federação de Mulheres Camponesas “Bartolina Sisa” da Bolívia, a Prêmio Nobel Rigoberta Menchú da Guatemala e Magui Balbuena da Coordenação Nacional de Mulheres Rurais e Indígenas (CONAMURI) do Paraguai.


Durante todo o percurso, os participantes invocavam a integração e a libertação do continente, rejeição às bases militares norte-americanas no continente e à criminalização das lutas dos povos. Dos predios, vários cidadãos/as saudavam os manifestantes que marchavam ao som da “batucada” e de música de grupos bolivianos.


A dirigente da Conamuri, Magui Balbuena foi a encarregada de dar as boas-vindas a todos e a todas na praça do Cabido, afirmando que o FSA é “um momento histórico para o povo do Paraguai, que possibilita encontrar-nos e compartilhar nossas lutas para criar uma grande frente de batalha contra o imperialismo, com esta diversidade avançaremos na construção de outro mundo possível.”


O ato teve como característica a locução nos idiomas que fazem parte do país, o guarani e o espanhol, a apresentação do coro Tava Guarani-São Pedro, integrado por jovens dessa mesma comunidade. Em seguida, o representante do Conselho Hemisférico do FSA, Edgardo Lander da Venezuela, se dirigiu ao público afirmando que este Fórum se produz em um palco político que sofreu mudanças em toda a região, manifestando que “o continente deve estar mais unido hoje, e deve reforçar a construção de alternativas que se levantaram, apoiando os modelos de sociedades que têm uma aposta diferente ao neoliberalismo”.


Assim se iniciou a IV edição do Fórum Social Américas onde 6.000 participantes discutirão diversos temas até 15 de agosto.

O discurso derrotista da Assembléia Popular

Comento depois.

Primeiro aqui vai o deitorial do último Brasil de Fato, jornal da Assembléia Popular (AP), organização de esquerda que flutua entre a crítica e o apoio ao governo Lula. A AP possui boa interlocução junto ao MST.

Aqui vai o editorial.



Elementos determinantes da campanha eleitoral




Estamos a cerca de 50 dias das eleições mais importantes da vida institucional do país. Vamos eleger presidente da República, senadores, deputados federais, governadores estaduais e os parlamentares das Assembleias legislativas estaduais.

Não há, no entanto, um clima de debates de ideias e de agitação política na sociedade. Parece que as campanhas eleitorais estão engessadas, moldadas por uma legislação que impede uma participação popular mais ativa. Limita comícios e atividades de agitação política próprias da natureza do processo. A burguesia brasileira reduziu a campanha eleitoral à propaganda na televisão, a marketing de pessoas – não de programas – que dependem de esquemas econômicos muito caros. Compra de cabos eleitorais – “militância” paga e material de propaganda sofisticados – se transformaram em fatos normais.

Com isso, tem mais vantagem os candidatos que conseguem maior arrecadações de recursos, junto a empresas, bancos etc., em mecanismos no mínimo promíscuos para quem deseja ocupar cargos públicos e administrar volumosos recursos do povo. Com isso, transformam a campanha num grande mercado eleitoral, onde tudo se compra, tudo se paga. Ou seja, não existem mais cabos eleitorais motivados por ideologia ou programas; não existe mais trabalho voluntário de campanha; não existe mais os métodos populares de debate de ideias, de convencimento, de disputa e agitação política entre militantes e a população em geral.

Período histórico
Neste cenário, há também o componente do período histórico que vivemos. A classe trabalhadora brasileira vivencia uma longa etapa de refluxo do movimento de massas, que vem desde a derrota político-ideológica para o neoliberalismo e a vitória dos governos Collor-FHC.

Então, há muita confusão ideológica e divisionismo, pela derrota política sofrida pela esquerda e pelo abandono das ideias socialistas por muitos setores que levam a todo tipo de desvios oportunistas entre candidatos de todo tipo.

Além disso, há uma desarticulação política das organizações de massa, que reduziram seus programas. Embora, justiça seja feita, houve tentativa de diversos segmentos organizados para discutir programas para o país. Nesse sentido, é louvável o esforço da CUT, com outras centrais sindicais que produziram uma proposta de governo, que está mais à esquerda do que os programas dos partidos. Também é louvável o esforço da Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) em costurar um programa de desenvolvimento nacional com a ótica dos trabalhadores, uma espécie de programa mínimo. E foi importante o esforço da Assembleia Popular em debater e produzir um programa de longo prazo, baseado no espírito do Brasil que precisamos.

Porém, todas essas iniciativas, importantes, não conseguiram ainda influenciar e determinar o debate entre os candidatos, em todos os níveis.

Condicionantes do melhorismo
O cientista político André Singer defende – em entrevista publicada na edição 374 do Brasil de Fato – algumas hipóteses que podem nos ajudar a entender o que estaria acontecendo com as massas. Segundo ele, a principal base social do governo Lula e de sua candidata Dilma, seria agora um sub-proletariado, que é a maior parte da classe trabalhadora brasileira. Mas que não tem tradição de organização, nem consciência de luta de classes. Melhorou suas condições de vida, o que o leva a apoiar o governo e sua candidata, mas sem querer disputa e conflitos. É a letargia das massas que apoiam o melhorismo. E são a maioria da população.

As candidaturas a presidente
Entre as candidaturas a presidente, o cenário, seus atores e o script já está definido. Não estão em jogo programas de partidos. As siglas estão mescladas e, às vezes, juntam interesses oportunistas e até antagônicos. Tampouco está em jogo as biografias pessoais, ou compromissos com a classe trabalhadora e os mais pobres. O que está posto são forças sociais que se alinharam com esse ou aquele candidato, e isso está determinando o resultado eleitoral, cujo desenlace terá poucas mudanças até o dia 3 de outubro.

Atrás da candidatura Serra estão as forças do capital mais atrasadas e subservientes ao império. Os grandes bancos, a grande indústria paulista, o latifúndio atrasado de Kátia Abreu e o agronegócio "moderno" do etanol. Seu programa é um só: a volta do mercado, benefícios para as empresas e a repressão para conter as demandas sociais. Seria a prioridade no programa dos três PPPs já aplicado em São Paulo: privatizações, pedágios e presídios.

A candidatura Dilma representa a continuidade do governo Lula e tem forças sociais entre a burguesia mais lúcida (temerosa da reação das massas), setores da classe média que melhorou de vida e amplos setores da classe trabalhadora. Praticamente todas as forças populares organizadas têm sua base social apoiando a candidata petista.

A candidatura Marina, apesar de seus vínculos passados com o PT e o governo Lula, não conseguiu sensibilizar a classe trabalhadora, e reúne apenas forças sociais representadas por setores ambientalistas da classe média urbana dos grandes centros. E por isso seu potencial eleitoral é muito pequeno.

E, por fim, temos três candidaturas de partidos de esquerda, com três lutadores do povo, de compromisso histórico com a classe trabalhadora. Mas nenhum deles conseguiu aglutinar força social organizada. E isso impede progressos eleitorais.

Os movimentos sociais
Os movimentos sociais em geral, e em particular, a Via Campesina, que sustentam a proposta do jornal Brasil de Fato, tem adotado uma postura política de evitar adesões explícitas a candidaturas. Mas todos eles manifestaram publicamente a decisão política de não medirem esforços para derrotar a candidatura Serra. A vitória do tucano seria a volta do neoliberalismo e do desprezo aos movimentos sociais. Quem tiver dúvida basta analisar o que foram os dezesseis anos de governo tucano em São Paulo. E nisso o candidato Serra tem sido honesto. Quando perguntado pelo Jornal da Band o que acha do MST e da reforma agrária, respondeu secamente que iria criar o Ministério da Segurança Nacional. Mais claro impossível.

As forças que o sustentam são a burguesia mais reacionária e corrupta desse país. E, certamente, o Departamento de Estado dos Estados Unidos está torcendo muito por sua vitória, para, com isso, alterar a correlação de forças na América Latina e fazer com que a bússola se mova para direita e para o norte.

Por todos esses elementos, o nosso jornal se soma à decisão política dos movimentos sociais que o sustentam de contribuir para a derrota de Serra, torcendo para que haja mudanças progressistas em todos os níveis das eleições. E que se reative o clima de debate de programas e de ideias na sociedade brasileira.



Voltei.

É triste notar em uma organização com tamanho poder mobilizador um discurso tão infeliz, pessimista. O pior talvez nem seja a análise pessimista e legitimadora do processo eleitoral como algo transformador.

O pior está na mentira, ou tentativa de. Qualquer leitor mais esclarecido notou de bate e pronto que o editorial é uma defesa envergonhada da candidatura Dilma.

Parece realmente que essa esquerda nacional não compreende nada mesmo. Afirmam pensar o Brasil, dizem querer discutir com os trabalhadores um novo projeto, mas vendem o mais do mesmo como solução por hora.

Sejam pelo menos honestos e digam a que vieram e de quem vestem a camisa sem firula que não somos bobos.

O que era ruim pode ficar pior

A Tv Cultura está programando uma grande reformulação em seu quadro de profissionais. Alegando inchaço de pessoal, a direção da emissora prometeu, e cumpriu, demitir uma enormidade de gente e contratar "nomes de peso".

A única boa notícia desta leva é a possibilidade de João Marcelo Boscoli, um dos donos da gravadora Trama, ter um programa diário sobre música. Podemos imaginar um ótimo espaço para bandas e artistas da cena alternativa darem as caras.

O problema é o preço a pagar. Este preço chama-se Manos e Minas. Um programa heróico da Tv aberta, aputado para a periferia, com apresentação de grupos de RAP e várias matérias sobre o mundo do hip hop.

Segue uma matéria do Brasil de Fato.

Patrícia Benvenuti

da Redação


Músicos, MC´s, Rappers, B-Boys, grafiteiros e organizações sociais de todo País estão mobilizadas contra a extinção do único espaço da cultura hip hop na televisão brasileira. A decisão de retirar o programa “Manos e Minas”, que vai ao ar aos sábados pela TV Cultura, da grade de programação da emissora foi anunciada na semana passada pelo presidente da Fundação Padre Anchieta, João Sayad.


O programa existia há quase três anos e apresentava, além da música hip hop, matérias direcionadas à juventude das periferias, com temas como gravidez na adolescência, violência nas escolas, crescimento do consumo do crack e autoestima da população negra. Ao todo, foram 93 programas e 93 apresentações de diferentes artistas.


Para o rapper Kamau a extinção do “Manos e Minas” representa não apenas o fim de um programa, mas o fim de um espaço importante dedicado à cultura da periferia. "Eu me sentia representado e [o fim do programa] é uma pena muito grande para a cultura hip hop e da periferia".


Kamau lembra que o programa foi uma conquista do movimento hip hop, frequentemente estigmatizado, e sua retirada significa a perda para uma grande parcela da população que não se vê em outros meios. "Onde vamos arrumar outro espaço como esse? Na tv aberta é muito difícil", pontua.


O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) também lamenta o final da atração. Para ele, o programa representava um avanço para a televisão. "Se trata de um programa inovador, diferente e que teve repercussão positiva. É um dos poucos programas que dá visibilidade à cultura hip hop", ressalta.


( vídeo do senador Suplicy em favor do “Manos e Minas” )


Reestruturação de Peso

Os trabalhadores da emissora souberam da decisão de retirar o “Manos e Minas” do ar por meio de entrevistas de João Sayad a jornais e páginas da internet. Como justificativa, para os funcionários, João Sayad alegou que a iniciativa deveu-se ao baixo Ibope da atração e a "questões artísticas", sem informar maiores detalhes. Os profissionais, no entanto, garantem que a audiência do programa não era inferior à média da TV Cultura.


Além do “Manos e Minas”, está confirmada a saída do programa “Link” da grade, que tratava de temas relacionados à internet. Outros programas, como o “Vitrine”, que trata dos bastidores da mídia, deverão passar por reformulações.


O novo plano de gestão de Sayad prevê também a contratação de nomes "de peso" para a emissora. O principal deles é o de Marília Gabriela que, a partir do dia 30 de agosto, comandará o programa "Roda Viva". Marília foi convidada para substituir o apresentador Heródoto Barbeiro na semana em que o jornalista desagradou ao candidato José Serra com perguntas sobre o preço dos pedágios nas rodovias de São Paulo.


(vídeo em que Serra é questionado por Barbeiro)


A TV Cultura também passará a exibir filmes da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e documentários do festival “É Tudo Verdade”. Já o dono da gravadora Trama, João Marcelo Bôscoli, ganhará um programa diário de variedades voltado para música que poderia vir a substituir o programa “Manos e Minas” sob o argumento de cobrir toda a diversidade da música popular brasileira.


Em entrevista à Folha Online, João Sayad confirmou que a meta das reformulações é modernizar a emissora e conquistar mais "prestígio" e audiência. "Estamos recuperando o prestígio da TV Cultura com personalidades conhecidas, em nome do espectador", disse.



Inchaço

Em diversas declarações, Sayad tem disparado também contra o "inchaço" do quadro de funcionários. Até agora, no entanto, não foram confirmadas demissões.


Uma funcionária da TV Cultura, que prefere não ser identificada, relata que existe, dentro da emissora, uma preocupação geral em relação ao futuro da TV, que deve ganhar contornos mais comerciais com o novo projeto. Ela lamenta também que a culpa por possíveis falhas recaia sobre os trabalhadores.


“Estão apresentando a TV como inchada e ineficiente. É uma grande injustiça, lá dentro tem grandes profissionais", afirma.


Ela critica ainda a postura do Estado em relação à emissora e aponta a falta de investimentos como uma dos principais erros. “Se os equipamentos estão sucateados, os funcionários não têm culpa”, salienta.



Mobilização

Desde o anúncio da extinção do “Manos e Minas”, a página do programa na internet tem recebido manifestações de apoio de telespectadores de todo o Brasil, que lamentam o fim da atração.


As manifestações se somam ao esforço de integrantes do movimento hip hop e de diversas organizações de todo País, que têm organizado uma campanha em favor do programa e da TV Cultura.


Os participantes da campanha enviaram uma carta ao senador Eduardo Suplicy, que se comprometeu a entregá-la ao presidente da TV Cultura, João Sayad. No documento, eles criticam a retirada do programa do ar e defendem o programa como um espaço dedicado à cultura das periferias.


Também estão sendo coletadas assinaturas para um abaixo-assinado. Para assinar, basta acessar o endereço http://www.ipetitions.com/petition/mem/.


Para o rapper Kamau, desistir do programa agora pode significar novas perdas depois.


"Perdendo o “Manos e Minas” agora significa que podemos perder algumas coisas depois. Se a gente mantiver o programa, será bom para todo mundo, não só para o movimento hip hop", enfatiza.


Vídeos em favor do programa “Manos e Minas”

Sobre o debate da BAND

Desculpe

Começo com uma análise da ótima Valéria Nader, editora do Correio da Cidadania, onde retirei o texto. Comento logo depois.


O debate dos presidenciáveis, o marasmo e uma dica para a esquerda

por Valéria Nader



Mesmo para aqueles já cientes e acostumados ao marasmo que tomou conta da cena política nacional, o primeiro debate entre os candidatos à presidência, promovido pela Rede Bandeirantes de Televisão, na noite do dia 5 de agosto, surpreendeu. Vem de longínqua data a desertificação de idéias e a homogeneização do pensamento político, bem como a apatia da população e dos movimentos sociais no que diz respeito ao exercício de sua cidadania e de seus direitos. Não parecia que um debate presidencial a mais ou a menos poderia suscitar um sentimento de ainda maior descrença na possibilidade de transformação de nosso país.

Os contendores de 5 de agosto conseguiram, de todo modo, reforçar a impressão de que se pode avançar mais na degringolada da qualidade dos debates. E se as discussões que protagonizaram forem tomadas como termômetro da atuação desses que se propõem a dirigir o país, só poderá restar muita desesperança aos brasileiros.

Dilma e Serra, como era de se esperar, polarizaram as discussões. Uma polarização, no entanto, absurdamente rasa e inócua. Os espectadores televisivos e os presentes no estúdio da Band depararam-se, no que se refere a estes líderes nas pesquisas, além de maiores representantes do status quo, com uma mistura de superficialidade, despreparo, confusão e mistificação. Problemas e desvios todos estes triviais nesse tipo de confronto, mas talvez percebidos como mais proeminentes no debate em questão. Afinal, após muitos anos, este é o primeiro confronto em que está ausente o presidente Lula, cuja popularidade conseguiu fazer como líder primeira nas pesquisas justamente a candidata que consegue reunir todos os ingredientes da mistura supracitada.

Marina não ficou pra trás na superficialidade dessa batalha. Para aqueles que porventura nutriam ainda alguma esperança quanto a uma possibilidade alternativa vinda do Partido Verde – conforme Editorial Marina: uma nesga de céu azul deste próprio Correio à época do lançamento da candidatura de Marina -, parece que precisam vislumbrar novos rumos. Não existe alternativa que possa ser minimamente oferecida a partir de uma risível insistência em permanecer no ‘caminho do meio’, em eterna busca pela conciliação e com a utilização de conceitos anódinos, a la ‘Terceira Via’. Para aqueles que, ademais, se mantêm mais visceralmente ligados às causas dos movimentos sociais, é inconcebível a posição titubeante e ambígua da candidata no que diz respeito à transposição do rio São Francisco e à construção da usina de Belo Monte – obras cujo impacto no meio ambiente deveria mobilizar de modo bem menos complacente aquela que está sempre a enfatizar a sua origem humilde em meio a nossas matas.

Em face de cenário tão árido e escasso de idéias relevantes, houve algumas inusitadas e surpreendentes intervenções. Plínio de Arruda Sampaio, ex-promotor público e deputado constituinte, atual presidente da ABRA (Associação Brasileira de Reforma Agrária), tocou em temas espinhosos e absolutamente negligenciados pelos veículos de comunicação e meios políticos - a efetivação da reforma agrária, a partir da desapropriação de terras a partir de 1000 hectares; a desigualdade na distribuição de renda; a redução da jornada de trabalho, sem redução salarial; e a controvérsia desenvolvimento versus meio ambiente. Do alto de uma história rica em experiências, acima de tudo, sempre vividas com muita coerência, abordou tais questões de modo direto e tranqüilo, interpelando os candidatos incisivamente a que se pronunciassem sobre elas.

A ‘pegada’ crítica e divertida utilizada por Plínio para ressaltar as diferenças entre o tipo de sociedade e modelo econômico defendidos pelo PSOl relativamente àqueles proferidos unanimemente pelos demais candidatos rendeu-lhe o ‘Trending Topics’ do Twitter mundial. O candidato chegou a ser o campeão mundial de citações no Twitter. Não mais poderia, portanto, ser tão acintosamente ignorado pela grande mídia.

Não é, obviamente, do interesse dos maiores veículos entrar na discussão das especificidades dos temas levantados pelo candidato, e que são justamente aqueles que o diferenciam dos demais. Até porque mexer nesses temas é cutucar os poderosos lobbies econômicos que atuam afinados com os maiores grupos de comunicação do país. Os grandes veículos passaram, assim, a ressaltar, nas várias manchetes que inundaram a mídia impressa e virtual durante e após o debate, o lado ‘provocativo’, de ‘franco atirador’ e ‘irônico’ do candidato.

Nada mal quando não se tem a menor ilusão no que se refere ao real posicionamento de nossa imprensa quanto aos ‘divergentes’, e para quem até agora ‘não existia’ – conforme salientado pelo próprio Plínio logo no início do debate. Mediante o imenso poder de reverberação propiciado pela internet, aqueles que não desistiram de fazer valer os seus direitos e a sua cidadania terão uma chance a mais de se deparar com um mínimo de dissonância no debate político de agora em diante.

A partir desse episódio, restam também algumas evidências para aqueles que pretendem uma atuação mais à esquerda no espectro político. Diante das óbvias e já tão divulgadas provocações e cutucadas do candidato do PSOL no sentido de conduzir a uma divergência mínima em uma discussão em seu âmago absolutamente convergente – como tantas vezes expresso pelo próprio candidato ao longo de todo o debate -, ficou claro que a maior postulante a representar uma alternativa política de fato no cenário nacional não cumpre em absoluto este papel.

É bom que os setores mais progressistas se atentem a este fato, e fiquem de olhos bem abertos. Afinal, já bastam as manipulações grosseiras levadas a cabo pelos setores mais à direita e também pela mídia em geral.

Em tempo: a mídia elege quem pode e quem não pode falar, quem é e quem não é candidato, e ficou apenas a trinca Dilma-Serra-Marina. O "furo" foi a lei que obriga a participação dos candidatos cujos partidos têm representação no Congresso nos debates de TV aberta, e por isso Plínio teve de ser convidado pela Band. No caso do debate Folha-UOL, que será transmitido pela Internet, o candidato não fará parte, já que a exigência para participação em debates na internet é um percentual de intenção de votos acima de 10%. Coisas do Brasil.

Valéria Nader, economista, é editora do Correio da Cidadania.



Voltei. Li muito sobre o debate da BAND na internet. De Reinaldo Azevedo, blogueiro da veja, passando pelo lulo-dilmista Paulo Henrique Amorim. Até ai, nada de muito significativo. Cada um puxou a sardinha para o seu lado. Assim como Nader, que escreve no site onde Plínio é conselheiro editorial, os outros também decretaram os seus vitoriosos. Eu perdi o debate. De repercussão televisiva, acompanhei uma análise feita na madrugada de domingo para segunda, também na BAND, no programa Canal Livre. Levando em consideração tudo, parece que Plínio foi mesmo o melhor no debate. Fica apenas uma pergunta: se o nome dele foi o top no tal twitter, quem além dos brasileiros usa isso?

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Zé Maria passou por aqui

A Paraíba recebeu um candidato a presidente nesta terça-feira. Eu não estive in loco, não tenho propriedade para reproduzir exatamente o dito ou o não dito pelo trotskista. Mas, ao tentar encontrar nos portais de notícias algo referenta a ilustre visita, me deparo com o silêncio, melhor, cegueira quase completa dos brucutus.

Digo quase porque o portal Paraiba1, tentáculo virtual do principal grupo de mídia paraibano, reprodutor dos signos globais nas terras do rio Sanhauá, estampou a visita em sua página principal. Obviamente ao final dela, depois de passar pelo embrólio jurídico que vem sendo o julgamento da legibilidade (ou não) de Cássio Cunha Lima.

Após ler o conteúdo, pensei "melhor seria se não tivesse uma única linha". Os motivos começam no título da matéria "Presidenciável do PSTU visita JP e defende o fim do bolsa família". Continuando a leitura, percebe-se um feito comum nas redações, em especial nos portais de notícias. Trata-se do texto não assinado. Assim como um filho sem pais, um texto com a definição 'da redação' no lugar do belo nome do repórter é uma anomalia.

A reportagem do Paraíba1 tem pai, isso é fato de simples comprovação. Os conhecedores das redações de portais sabem que o repórter é um faz tudo. Ele entrevista, faz as fotos, edita o texto, titula...

Assim, fica óbvio, foi a Camila Alves, creditada na foto da reportagem, a entrevista concedida pelo presidente nacional do PSTU. Já o texto final não posso garantir. Provavelmente ao chegar a redação e finalizar o texto mostrando que o candidato mostrou a vaibbilidade do socialismo, o redator tomou para si o filho e fez uma abertura à moda da casa.

"Em entrevista ao Paraíba1, o político, que também é presidente nacional do PSTU, revelou projetos radicais e se diz contra o Bolsa Família e a Transposição do Rio São Francisco". Pronto, o chefe já tinha dado nova cara ao texto.

Mas o que disse exatamente Zé Maria? Sobre o bolsa família "que esse povo precisa é de emprego. O governo precisa garantir trabalho e salário digno para as mais de 40 milhões de pessoas que dependem dessa ajuda do bolsa família".

E a Transposição? "Só vai beneficiar 4% da população e resolver os problemas das grandes empreiteiras. Nossa proposta para acabar com o problema das secas é que primeiro sejam realizadas um série de pequenas obras, a exemplo da construção de cisternas, que beneficiem toda a população e não só uma parcela dela. E segundo que o Governo apóie financeira e tecnologicamente os agricultores, fazendo um estudo de clima e solo e identificando qual tipo de cultura se adequa melhor à região".

Eu entendo Camila. Se é para assinar isso, é melhor ficar com as fotos. E que outros criem a criança.